Cura Interior

O dízimo lost


Pedro e Maria estão num vôo para a Austrália para umas férias de duas semanas, comemorando seu 40º aniversário de casamento.

De repente o comandante anuncia pelos alto-falantes:

- Senhoras e senhores, tenho notícias muito ruins. Nossos motores estão parando de funcionar e vamos tentar um pouso de emergência. Por sorte, estou vendo uma ilha não catalogada nos mapas logo abaixo de nós e vamos tentar aterrisar na praia.

Ele aterrisou com êxito, mas avisou aos passageiros:

- Isto aqui é o fim do mundo e é muito provável que a gente não seja resgatado e tenhamos que viver nessa ilha pelo resto de nossas vidas!

Nessa hora, Pedro pergunta para a mulher:

- Maria, você pagou o dízimo da Igreja Universal este mês?

- Ai, me perdoa, Pedro. Eu me esqueci completamente!

Pedro, eufórico, agarra a mulher e tasca o maior beijão de todos os 40 anos de casamento. A Maria não entende e pergunta:

- Pedro! Por que você me beijou desse jeito?

E ele responde:

- Eles vão nos achar!

A imanência das lágrimas de Deus


Não podemos negar que a nossa alma tem dimensões e recônditos que ninguém é capaz de compreender, lágrimas que não se explicam pela lógica, dores impossíveis de serem compartilhadas e que ninguém é capaz de suportar; e crises existenciais de fé, pelas quais, não há empatia possível pra consolar-nos. E, em muitos momentos de nossas vidas, é impossível esquecer daquelas noites mal dormidas quando nossa fé se perde nos labirintos de nossas crises existenciais e a solidão assalta nosso coração nos fazendo vítimas e reféns da dor. Neste cenário escuro e sombrio de tristezas e incertezas, nossos gritos de desespero e desabafo são inexprimíveis aos ouvidos da empatia do coração amigo mais próximo. O que nos resta é ter a solidão como companhia, as lágrimas como leito e o soluço como embriagues de nossa alma.

Quando nos encontramos em tal estado de espírito perturbado, nossos sentidos, doloridos pela dor, esquecem da presença amorosa de Deus em toda a realidade de nossa existência, que partilha conosco de todas as experiências de nossa alma. Esta presenca revela a imanência de Deus na existência humana. Ou seja, Deus está envolvido e permanece dentro de sua criação, pois ela depende Dele para existir e manter-se em atividade. Porque nós mesmos estamos imersos em Deus como fundamento de toda realidade existencial. Isso implica dizer que Deus não está distante nem desinteressado por nossas crises existenciais. Isso nos faz saber e crer que os gritos de nossa alma são sempre ouvidos por Deus no silêncio de nossa fé.

A imanência de Deus foi revelada na encarnação de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo na história humana. Sua encarnação faz o Deus Emanuel um de nós e imanente na identificação das realidades e crises da existência humana. Assim como nós, nosso Senhor Jesus Cristo de Nazaré foi encontrado em forma humana. “Embora sendo Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo que devia apegar-se, mas esvaziou-se a si mesmo, vindo a ser servo, tornando-se semelhante aos homens. E sendo encontrado em forma humana...” (Fp 2:6-8), ele possuiu um frágil corpo de sangue, músculos, fibras nervosas, ossos e alma/espírito. E suas fibras nervosas e sua alma sentiam as mesmas dores que todos nós sentimos.

O Filho de Deus veio ao mundo envolto em sangue e lágrimas numa pobre majedora, nasceu na periferia do mundo, cresceu pobre, viveu nossa história, conheceu nossos valores, sofreu nossos problemas, sentiu nossas dores, foi oprimido e desprezado, ficou deprimido e angustiado, sentiu-se abandonado e incompreendido, participou de nossos sonhos e esperanças até morrer agonizando numa cruz envolto em sangue e lágrimas. Cristo viveu aprendendo e sofrendo como homem, a ser humano como nós. O teólogo alemão Jürgen Moltmann disse: “Deus não se revelou em Jesus para tirar nossas dores, mas para compartilhá-las. Em Jesus, Deus revelou-se a nós como um Deus sofredor. Ele entrou em solidariedade com a humanidade”. Em outras palavras, na cruz, o sangue de Cristo foi derramado para remissão de nossos pecados, e nos céus, a imanência das lágrimas de Deus foi derramada para consolar todos os que choram.

Mas a história da imanência das lágrimas de Deus, na encarnação de Cristo, continua na ressurreição. O Cristo ressurreto levou consigo, à eternidade, as marcas de seus ferimentos. E à destra de Deus se encontra o nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, com marcas de suas dores para identificar-se com nossos sofrimentos por toda a eternidade. Assim, mesmo em meio a crises, conflitos, incertezas, dores e perturbações, nós podemos crer que as lágrimas de Deus lavam nossos olhos para enxergarmos, no banal, a empatia de seu amor, a consolar nosso coração e regar a nossa fé, para frutificar numa maturidade até que o caráter de Cristo seja formado, plenamente, em nós.

Jairo Filho


A ditadura do novo


“Nossa geração vive insaciavelmente faminta por novidades. A descontente alma humana mendiga nas ruas compulsiva pelo novo. Vive-se mendigando novidades para sair dessa vida saturada; para libertar-se do ciclo das mesmices; para sair da monotonia; para interromper a rotina; para transformar a semana; para fugir do mesmo lugar; para não conviver mais com as mesmas pessoas chatas de sempre; para nada mais ser enfadonho; para ressuscitar do ócio; para não morar na mesma casa de sempre; para não viver mais no tédio; para abdicar da melancolia; para abolir a escravatura da agenda; para abnegar a organização; para não ser mais saturado; para não ver reprises; para mudar o hábito; para libertar-se do vício; para rebelar-se contra a ordem imposta; para romper com os mesmos usos e costumes da moda de sempre; para não ser acostumado; para não repousar na inércia; para não conhecer apenas o conhecido; para não repetir o mesmo; para não ter a mesma rotatividade; para abolir a privação do mesmo; para quebrar os mesmos paradigmas; para liquidar o sólido; para não ter nada pronto; para renunciar a tradição; para ser fora da lei; para não falar as mesmas palavras; para não escrever os mesmos textos; para romper com o mesmo padrão; para não ter os mesmos insights; para não bater o cartão de ponto do trabalho no mesmo horário; para não criar a mesma criação; para não ser antigo; para nada ser exato e previsível; para não ouvir, cantar e tocar as mesmas músicas; para desistir do mesmo caminho seguido; para tirar o time de campo e jogar em outro; para rejeitar as fórmulas; para abandonar os sistemas; para extinguir a burocracia; para não vestir o mesmo uniforme; para não comer a mesma comida; para desprezar o consagrado; para mostrar desdém a fidelidade. Enfim, para não ser mais como sempre foi; para não ter o que sempre teve; para não ver o que sempre viu; para não sentir o que sempre sentiu; para não ficar nem andar e nem parar no mesmo lugar; para não buscar o que sempre encontrou; para não fazer o que sempre se fez; para não consumir o que sempre comprou; para nunca pensar com a mesma cabeça; para nunca amar com o mesmo coração e para nunca sentir a mesma emoção; e, finalmente, para não fazer leituras cansativas, enfadonhas e repetitivas como esta. Mas, quem consegue realizar tudo isso?



Buscamos novidades sempre, porque a ditadura do novo cria essas necessidades insaciáveis, cria a sensação de vazio em nossa alma, nos induz a ver que tudo na vida não passa da mesmice de sempre e chega ao extremo de incitar nossa rebeldia contra tudo o que não é novo. Em nossa cultura, queremos fazer sempre de um jeito que ninguem fez antes. Enjoamos da novidade de ontem, queremos o novo de hoje. Vivemos o hoje esperando que seja feita com urgência alguma novidade pra amanhã. Porque a novidade de hoje já ficou velha faz tempo.


Do ciclo vicioso pela novidade instantânea, imediata, pragmática e rápida surge sempre uma necessidade de ter, pegar, experimentar, degustar, olhar, viver, sentir, fazer, consumir e buscar sempre algo diferente, novo e variável a cada novo instante. Porque nunca se está satisfeito com o mesmo. Em nossa cultura, nada é tão novo assim que não precise ser mais novo do que era antes. A nossa cultura sente um desprezo, um enjôo, uma gastura, um nojo, uma antipatia, um distanciamento, uma aversão, uma afastamento e uma repulsa contra o mesmo. Todos os dias procura-se um novo mais novo do que o novo de ontem e de hoje. A ditadura das novidades fecha os museus e proíbe contar as mesmas e antigas histórias em preto e branco que sempre se contou. No lugar disso, abrem-se lojas que vendem variedades coloridas mais diferentes e mais novas do que experimentamos alguns segundos atrás para serem sempre consumidas a cada dia de jeito diferente.


Não é difícil perceber que o mundo de hoje é uma vitrine e uma grande prateleira de variedades diferentes, novas, inusitadas, inéditas, atuais, inovadoras, futuristas, vanguardas, contemporâneas, prodigiosas, espetaculares, extraordinárias, fantásticas, singulares, pós-modernas, extremas, descompromissadas, criativas, instantâneas, desformes e imprevisíveis. Quando pensamos em consumir os objetos de desejo que sonhamos há tempo, não há mais tempo, porque já surgiu algo novo na praça e na mídia que prende nossa atenção, atiça nossa curiosidade e cria novos desejos de consumo imediato. Isso acontece porque hoje não dá tempo para curtir o novo, porque o novo fica velho em menos de um segundo. Se parar pra olhar, pensar, gostar, pegar, saborear, sentir e consumir, já surge outro novo mais diferente do que era antes e ficamos para trás e atrasados no tempo e no espaço.


A cultura da ditadura do novo tem aberto espaço para o perigo do surgimento da cultura do aluguel, do descartável, do cru e do superficial. Podemos perceber isso no consumismo. Ser consumista não é acumular bens e usá -los por muito tempo, mas comprar compulsivamente produtos para depois jogá -los fora, afim de abrir-se pra novos desejos, novas curiosidades, novas sensações, novos bens e usos. Assim, não compramos, mas alugamos e, logo depois, descartamos. E no fim, nem usufruimos direito o que consumimos. Aqui, o tezão está em consumir novidades e não, em possuir algo. Da mesma maneira, a ditadura do novo avança e atinge nossos relacionamentos. A ditadura do novo promove a cultura de que ninguém mais consegue conviver com as mesmas pessoas o tempo todo e por muito tempo. Disso, surgem parcerias frouxas, superficiais, descartáveis e descompromissadas. Numa relação de amizade ou de romance mais permanente sempre há aquela impressão de que se está perdendo algo melhor. Para a ditadura do novo, um relacionamento fiel é uma armadilha que fecha as portas para novas possibilidades, sensaçoes e curtições, quem sabe, até melhores do que a que está no momento. Aqui, o tezão está em ter várias parcerias, amigos e romances diferentes ao mesmo tempo e em todo tempo para depois descartá -los e abrir-se para novas aventuras apaixonantes. O verbo amar não é conjugado nesses tipos de relacionamentos, porque isso implica em compromisso e na possibilidade do casamento. Isso acontece porque a ditadura do novo nunca admite as mesmas experiências, a mesma rotina e a mesma vida de sempre.


A ditadura do novo tem exigido que a nossa cultura descarte as virtudes eternas como a intimidade, a profundidade, a espera, a curtição, a degustação, a persistência, o aproveitamento, o consumo, a continuação, a permanência, a tradição, o costume, a história, a eternidade, a admiração, a contemplação, o amor, a fidelidade, a meditação, e, consequentemente, a nossa vida que é única e é a mesma desde que nascemos. Porque a nossa geração é pressionada a ter o novo para ser feliz. Hoje, felicidade é conviver diariamente com o novo. O novo é o deus de nossa geração. Mas esse deus tem deixado a nossa geração doente. A ditadura do novo tem formado uma geração faminta, liquída, insasiável, insatisfeita, desconsolada, inconformada, descontente, pertubada, ansiosa, exigente, vazia, impaciente e pragmática. Além do mais, a ditadura do novo causa murmuração, vazio, insatisfação, ingratidão, ciúme, tristeza, ganância, descontentamento, inveja, cobiça e compulsão. O pior é que diagnosticamos que não tem como não ter a mesma rotina de vida de sempre. Alguém consegue ter sempre algo novo em sua vida? Sera que é necessário ter sempre algo novo em nossas vidas? Por que precisamos tanto de novidades para viver? É por que com tantas novidades consumidas, nosso coração nunca está contente e satisfeito? E é aqui que mora o perigo. É aqui onde queriamos chegar. Por que existe esse insasiavel desejo pelo novo?


A filosofia, a sociologia, a psicologia e as demais ciências humanas podem perceber, explicar e descrever as causas e os efeitos do anseio por novidades que nossa sociedade vive. Mas não conseguem curar nossa geração do descontentamento causado pela ditadura do novo. Aqui, mudamos o foco de diagnosticar a ditadura do novo para buscar a cura do descontentamento de nossa geração. E ousamos dizer, sem a menor sombra de dúvida, que a cura para esse descontentamento da alma está em viver fora de Deus. Porque somente Deus é o contentamento do coração do ser humano. E nunca viveremos satisfeitos, consumindo novidades impostas pela ditadura do novo. Pelo contrário, viveremos sempre algemados a ditadura do novo. E porque a busca insasiável pelo novo vira numa mesmice de todo jeito: a mesmice da ditadura do novo. A ditadura do novo se torna em mais um mesmo de sempre.



A único jeito de conseguir a liberdade contra a ditadura do novo é reconhecendo quem somos. Podemos dizer que fomos criados de Deus e para Deus. Depois que o homem se rebelou contra a santa vontade de Deus, o homem cometeu suicídio existencial, causando um vazio em seu coração do tamanho de Deus. Porque não há vida fora de Deus. Durante todo sua história, o homem vem tentando preencher seu coração com as variadas novidades instantâneas que surgem sempre. Mas nessa busca, o homem tem se frustrado em saber que seu coração é faminto e insasiável. Mas, há esperanca. A Biblia, nos ensina a viver contente e satisfeitos em Deus mesmo quando sofremos por perdas, mesmo quando não temos o que desejamos, mesmo vivendo na mais diversa situação adversa, mesmo quando não sentimos o que queremos sentir e mesmo quando a vida não passa da mesmice de sempre. Quando desfrutamos de um relacionamento com Deus, recebemos uma nova vida em Cristo. E vivemos em novidade de vida, porque, em Cristo, Deus satisfaz a fome do nosso coração.


Essa é a boa notícia de liberdade contra a ditadura do novo. É a notícia de que, em Cristo, viveremos contentes em toda e qualquer situação, porque, Deus nos fortalece durante todos os momentos que passarmos. O Paulo, apostolo, nos diz que: “...aprendi a adaptar-me a toda e qualquer circunstância. Sei o que é passar necessidade e sei o que e ter com fartura. Aprendi o segredo de viver contente em toda e qualquer situação, seja bem alimentado, seja com fome, tendo muito, ou passando necessidade.Tudo posso naquele que me fortalece” (Fp 4.11-3), “...porque o seu Pai sabe do que voces precisam, antes mesmo de o pedirem” (Mateus 6.8b). Isso é felicidade em Deus. Isso é ser livre da ditadura do novo que provoca necessidades insasiáveis. Isso é viver em feliz, contente e satisfeito em Deus vivendo em toda e qualquer circunstância, seja adversa ou divertida. Assim, poderemos entregar todas as nossas necessidades nas mãos de Deus e fazer um coral em adoração com o salmista: “Como a corça anseia por águas correntes, a minha alma anseia por ti, ó Deus. A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo...” (Salmo 42.1e 2a). Agora não precisam me dar nenhuma novidade. Estou satisfeito com o que tenho e com o que sou. Vivo a vida simples de viver com a espetacular presença de Deus em meu coração. Agora estou contemplando o Deus da minha vida que nunca é uma mesmice.



Jairo Filho

Do lamento ao engajamento


Não tem como esconder que temos todos os motivos do mundo para viver lamentando e para lamentar vivendo. Nossa geração vive um clima de decepção existencial, espiritual e social. Hoje, celebramos o funeral de nossos sonhos pessoais, de nossos ideiais de vida moral e espiritual, e de nossas utopias políticas-sociais para um mundo melhor. Estamos vivendo uma crise de depressão, decepção, frustração, dúvidas, ravia, desilusão, desencatamento, tristeza, pertubação, descrença, desânimo, desalento, insegurança, perdas e danos. É trágico dizer que estamos vivendo sem destino, sem esperança e sem sentido. Agora, só nos resta o lamento como nosso consolo e desabafo, e concordar com o refrão do sábio de eclesiástes de que “Tudo é ilusão” e “Nada faz sentido”.

Não tem como esconder nosso lamento pela decepção existencial que nos cerca. Parece que muitos de nossos sonhos pessoais são destruídos por capricho do destino. Ás vezes, a vida parece ser tão injusta: Os ruins são recompensados, enquanto os bons são castigados (Ec 7.15). Enquanto isso, o sonho de estudar numa faculdade, do casamento feliz, da casa própria, do emprego, da educação dos filhos, da saúde perfeita, das férias merecidas, da viagem dos sonhos e da vida feliz nem sempre se realizam como desejamos. Ás vezes, não dá pra não esconder aquele choro provocado pela saudade, rejeição, traição, abandono e falsidade. Parece que não adianta mais confiar nas pessoas que nos relacionamos. A única saída é fechar nosso coração para não se envolver com mais ninguém nem confidenciar nossas intimidades com mais ninguém. Chega de envolvimento. Os relacionamentos pessoais só nos machucam. Também lamentamos porque cansamos de tentar mudar nosso jeito de ser para agradar a todos e não conseguimos. Chegamos a conclusão de que nunca seremos tão bons quanto se espera que sejamos. Quando lemos a Bíblia, somos sempre reprovados. Quando pensamos que estamos fazendo tudo certo, nos surpreendemos com nossa reprovação pelo alto padrão de obediência exigido por Deus. Por isso, não tem como não lamentar por nós mesmos.

Não tem como esconder nosso lamento pela decepção com a imoralidade social que nos cerca. Lamentamos porque aquela liberdade de expressão que surgiu como grito de liberdade contra a ditadura relativizou os absolutos morais e espirituais. Não temos mais um padrão da verdade. Tudo é subjetivo e julgado pela emoção de cada um. Com isso, a liberação sexual transformou os relacionamentos em encontros superficiais, descartáveis e vazios de amor. O individualismo surgiu como meio de liberdade e independência, mas acabou nos enterrando na insegurança da solidão e nos alienando dos gritos de socorro do nosso próximo. O consumismo do capitalismo selvagem prometeu prosperidade, mas acabou nos algemando em dívidas e prestações. A televisão só mostra reportagens que noticiam tragédias, catástrofes, violência, pobreza, fome, miséria, corrupção política, roubos, mortes, sofrimento e guerras. Os programas de entretenimento doutrinam o povo a viver e aceitar passivamente o adultério, mentiras, ódio, vingança, traição, arrogância, galmourização dos conflitos familiares e etc. É trágico dizer que estamos num estado de calamidade pública sem nenhuma referência moral para nos guiar. Com isso, o sonho da honestidade, da solidariedade, do altruísmo, da fraternidade, da paz, do amor verdadeiro, da fé em Deus e da justiça é totalmente destruído. Esse é o nosso lamento social.

Não tem como esconder nosso lamento pela decepção espiritual que nos cerca. Estamos cansados de ouvir histórias dos gritos de dor e decepção de mulheres que perderam seus filhos depois de ter dado tantos dízimos e ter feito tantas campanhas de oração na igreja para comprar a cura de Deus para seu filho. São vítimas que acreditaram num Deus pintado por pastores picaretas que se acham porta vozes e mediadores de Deus enquanto cobram pedágio-dízimo para pessoas lucrarem alguma benção de Deus nos corredores de seus mega-templos. Vejo seminaristas, pastores e teólogos decepcionados com o intelectualismo teológico vazio, alienado e sem vida que se propagam nas faculdades e congressos. Cansamos de presenciar pessoas sendo vítimas do complexo de culpa e do medo de Deus tentando apagar Sua ira com altas indulgências na tentativa de comprarem o perdão de Deus para serem salvas ou continuarem salvas. Ainda vejo a geração cristã decepcionada com os cultos da marcha ré do evangelho. Porque em vez dos líderes evangélicos levantarem uma voz de denúncia profética contra as injustiças em nosso país, levantam apenas vozes famosas no show da fé evangélica para cantar músicas de entretenimento e deixar o povo ainda mais alienado e de bem com a vida que tem. É um falso evangelho que marcha atrás do vento. E não passa de vaidade. Tudo isso é vaidade. Irmãos, eis nosso lamento.

Não tem como esconder nosso lamento pela decepção com os movimentos políticos-sociais de nosso país. Lembro que Cazuza já era vítima da decepção político-social quando lamentava em suas musicas: ”Aquele menino que queria mudar o mundo, assiste tudo em cima do muro. Meus heróis morreram de overdose. Meus inimigos estão no poder. Ideologia, eu quero uma pra viver”. Nossa geração perdeu seu referencial, seus modelos, seus heróis e com eles, seu furor de revolução e luta por justiça social, por não acreditar mais em nenhum tipo de transformação. E agora assiste o espetáculo da corrupção destruir nosso país sentada em cima do muro da dúvida, da indiferença e do ceticismo. Os movimentos politicos-sociais brasileiros que lutavam pela justiça e igualdade social fracassaram quando chegaram ao poder. Que o diga aquele ex-líder operário que esqueceu de sua luta pela igualdade social e pela revolução do proletariado brasileiro na presidência do país mais desigual do mundo. Do outro lado, a população não tem mais segurança pública. Não temos mais saida: Se ficar, a máfia dos anões, mensalões e sanguessugas come o dinheiro público. Se correr, o PCC nos pega na rua. E se fugir para o campo é arriscado que os sem vergonhas tenham invadido e saqueado o que é seu e te deixado sem terra. Sem falar que desde sempre, os políticos soltam suas teorias, promessas e projetos nas campanhas eleitorais para solucinar os poblemas da fome, desemprego, violência, educação, saúde e moradia, com discursos que não passam de conversa fiada. Que espirito votar nas eleições? Para nossa geração, o Brasil que nasceu torno nunca se indireita. E não adianta fazer mais nada. Companheiros, seja nosso lamento ouvido nos corredores do planalto.

Não tem como esconder nossas decepções com a indiferença e insensibilidade estóica. Como disse antes, temos muitos motivos para viver lamentando e lamentar vivendo. Por isso, minha empatia amiga lamenta agora com você por todas as nossas decepções. Considero que lamentar é reconhecer nossa fragilidade, limitação, finitude, vunerabilidade e fraqueza humana, a fim de desabafar nossos gritos engasgados de dor, denunciar as injustiças e reconhecer nossa dependência de Deus. E isso é biblicamente saudável. Lamente com o lamento dos profetas e dos salmistas. A lamentação bíblica tem um olho no homem e o outro em Deus. A lamentação bíblica é a porta aberta para a esperança chegar após confessar nossa limitação e nossa fé em Deus. Agora, lamente apenas pelo que deve ser lamentado. Lamente pela dor que sofreu, por não ser o que devia ser ou pelo que queria ter e não teve. Se passar disso, ou passar muito tempo lamentando, o lamento pode se tornar em murmuração, incredulidade e ingratidão. E a lamentação que era saudável para nossa alma passa a ser doentio e pode matar nosso interior aos poucos. Porque se torna numa ofensa ao caráter bondoso de Deus pelo fato de ficarmos cegos diante de seu agir e vivermos com a aminésia das bençãos de Deus em nossa história.

Poderíamos passar horas e horas citando nossas mais diversas decepções e lamentando por elas. Mas, agora pense comigo: Não é a primeira nem a última vez que somos assaltados e vítimas das decepções da vida. A história é cíclica e/ou espiral. Nada é tão novo e nada é tão velho debaixo da terra. Por isso, não podemos nos deixar viver a vida toda na mesmice de nossa lamentação. A lamentação não pode ser uma rotina cíclica em nossa vida. Existem duas opções para reagir as crises de decepção: viver enterrado na lamentação ou viver engajado na esperança do Reino de Deus. Quem vive lamentando a vida toda vai chegar ao ponto de murmurar por nada na vida e ser um decepcionado sem causa. Mas quem olha para a cruz de Cristo decide viver engajado em todas as realidades da vida e pode ainda colher esperança no coração para ter forças de promover alguma transformação. Devemos olhar para cruz para sinalizar a esperança do Reino de Deus e viver cumprindo nossa missão no mundo sem Deus. Por isso, nunca é cedo nem tarde demais para levantar a cabeça e sacudir a poeira da lamentação.

Se voce lamenta pelos seus sonhos destruídos, mude seus sonhos e entenda que você deve sonhar o sonhos de Deus. E Deus deseja que você sonhe em ter um relacionamento íntimo de amor com Ele, enquanto serve as pessoas em sua volta. O resto é conseqüência. Agora levante a cabeça e não espere sua vida ficar organizada demais, nem espere o momento ideal chegar, nem muito menos as dificuldades cessarem para você comecar a crêr num mundo melhor e agir. Se você deixar para agir quando sua vida estiver organizada, você nunca deixará de ser um espectador da vida. Porque vida nenhuma vai estar organizada. No máximo vai estar menos desorganizada. Além disso, Deus está agindo em nossas vidas neste instante em meio aos problemas e decepções da vida. Em outras palavras: O Reino de Deus está sendo sinalizado no meio e através das dificuldades do dia a dia. E ainda, se você lamenta pelo seu fracasso como pessoa, lembre-se de que nosso pecado não é um empecilho para a bênção de Deus, assim como nossa obediência não é uma condição para sermos abençoados por Deus. Deus nos abençoa seguindo as iniciativas de sua graça sobre nós. E a cruz é a prova maior da graça de Deus que nos transforma em pessoas melhores, apesar de nós mesmos. E ainda, seu Santo Espírito nos ensina e nos ajuda obedecer a Deus por amor, enquanto produz seu fruto em nosso caráter (Gl 5:22). Abra seu coração e sempre deixe-se encher pelo Espirito Santo e olhe para si mesmo com os olhos de Deus. Assim, nossos olhos devem mirar em quem podemos ser em Cristo e não em quem não conseguimos ser ou não somos por nossos próprios esforços e méritos.

A cruz de Cristo nos faz olhar para a nossa realidade espiritual e político-social com os olhos do Reino de Deus. Nossa lamentável realidade não se limita ao que vemos. Jesus inaugurou o Reino de Deus quando esteve aqui nos ensinando que o sentido da sua vida era servir, porque ele, mesmo sendo nosso Rei, não veio para ser servido, mas para servir as pessoas. Cristo tinha muitos motivos para viver lamentando e lamentar vivendo. Ele poderia lamentar porque saiu da destra de Deus Pai para habitar entre nós pecadores. Poderia viver lamentando por ter sido gerado ser humano no ventre de uma virgem suspeita de adultério, fugitiva e perseguida pelo governo. Jesus poderia ter lamentado por ter nascido numa pobre manjedoura, por ter crescido num povo subjulgado por um império rico e poderoso, por viver numa nação governada por um político corrupto que coloca nossos políticos no bolso, por não ter sido recebido pelo seu povo como filho de Deus, por ter sofrido perseguição dos religiosos, por ter sido rejeitado e humilhado pela mesma multidão que num dia o rebeceu como Rei e no outro dia gritava furiosamente crucifica-o; e ainda, por ter sido traído por dinheiro, negado por vergonha e abandonado por covardia dos seus 12 amigos quando ele mais precisava deles. Jesus tem todos os motivos do mundo para viver decepcionado com a vida que viveu e lamentar vivendo. Mas seu grande amor que nos constrange nos ensinou a levantar a cabeça e servir as pessoas, mesmo quando nossa vida está desorganizada pela decepção e pelo lamento. Agora, concentre-se nele, Jesus Cristo, que não mediu esforços para vencer a decepções da vida injusta que teve para provar o quanto te ama. E mesmo assim, Jesus achou que sua vida valeu apena, porque seu serviço na cruz nos ofereceu perdão dos pecados, reconciliação com Deus e salvação eterna. E isto vale a pena porque valeu a tua vida.

Impactados com a vida de Jesus, temos que nos arrepender de sermos apenas analistas da vida, espectadores do mundo, comentaristas do cotidiano e juízes morais dos outros. Passamos muito tempo engajados em teorias, projetos e discursos enquanto nos enterramos em nossas murmurações, críticas e julgamento que nem se comparam com a denúncia profética dos profetas veterotestamentários. Passamos muito tempo sendo consumidos pela inércia de nosso ócio egoísta que vive isolado, arrebatado e alienado do sofrimento das pessoas que estão em nossa volta. Sublimamos nossa missão de encarnar o evangelho no mundo fugindo para a espiritrosfera de nossos cultos extáticos ou quando nos escondemos na burocracia das reuniões dos gabinetes do clero de nossa denominação. Mas a encarnação de Jesus é o modelo de engajamento que temos que viver para transformar as vidas dos necessitados em nossa volta. A vida de Cristo nos ensina a não esperar fazer grandes projetos, empreitadas, organizações e grande mutirões para mudar o mundo. Em muitos momentos, temos que servir a Deus despido de títulos, cargos, lugar de destaque, momento ideal e vida organizada, e até mesmo, servir sozinhos sem nenhuma recompensa ou reconhecimento dos olofotes e aplausos da mídia. Faça como Cristo: Sua encarnação em nosso mundo é o modelo de vencer nossa decepcionante realidade para vivermos engajados no meio das necessidades das pessoas oprimidas e de uma forma ou de outra ajudá-las. Talvez seu nome nunca seja citado pela mídia ou até mesmo seja esquecido. Mas, lembre-se que a história é feita por anônimos que fazem uma parceria com Cristo, a fim de servir as pessoas no poder do Espírito Santo sinalizando seu Reino de Paz, amor e justiça. Assim, se uma pessoa respirou melhor por sua causa, então sua vida valeu a pena, o Reino de Deus foi visto e nós celebramos a vida.

Eu te garanto que nunca seremos servos engajados na vida real, enquanto nosso ego pensar somente em nossa realização pessoal, esperar sempre um milagre espetacular todos os dias, ter dinheiro suficiente, esperar o momento ideal chegar e ter todos os recursos disponíveis para servir. Sair do muro das lamentações da vida para o engajamento é conviver com frustração, perdas, ganhos, decepções, esperança, injustiças, amor, alegrias, derrotas, risos, lágrimas, calma, agitação, paz, ansiedade, e essencialmente, coragem para mudar e coragem para envolver-se com todos e com a vida como ela é. Somente quando tivermos coragem para envolver com a vida e com essa mesclagem de sentimentos confusos e opostos, é que poderemos sair do lamento para o engajamento. Que Deus nos ajude a fazer esta transição: do lamento ao engajamento.

Jairo Filho

Leia isto antes de ler a Bíblia


A Bíblia não é um livro de regras, mas de princípios. E o que é um princípio bíblico? Princípio bíblico é uma verdade revelada pela Palavra de Deus que serve de base orientadora e autoritativa para nossa forma de pensar, sentir e agir. Um princípio bíblico não é uma lei religiosa imposta com uma expectativa de premiação aos obedientes, ou com um peso sobre nossas costas que ameaça os desobedientes com castigo e um complexo de culpa. Para que isso não aconteça devemos ter em mente algumas considerações preliminares. Assim, leia isto antes de ler a Bíblia a fim de ter uma correta interpretação do que se lê:

(1) Nenhum homem é capaz de obedecer a Deus por seus próprios méritos e sacrifícios. Todas as vezes que lemos a Bíblia somos reprovados pela nossa natureza pecaminosa que nos impulsiona a nos afastarmos de Deus e sermos condenados pelos nossos pecados cometidos. (Rm 3:10-11). Assim, Quando vemos nossa alma no espelho perceberemos que somos incapazes de satisfazer o alto padrão de obediência exigido por Deus, porque nossa natureza pecaminosa nos impede de obedecer a Deus por nós mesmos (Rm 3:23).

(2) Nossa obediência é possível por causa de Cristo. Jesus Cristo satisfez toda a justiça de Deus; ou seja, Jesus obedeceu toda a vontade de Deus em nosso lugar, e, ainda, sofreu todo o castigo que merecemos por não satisfazermos a vontade de Deus. Assim, por causa de Cristo, somos motivados e capacitados a obedecer a Deus de coração (Rm 3:22-25). Porque, em Cristo, toda obediência a Deus é feita por sua graça que nos capacita a vencer nossa natureza pecaminosa para vivermos sensíveis a direção do Espírito Santo no caminho da obediência a Deus. (Rm 8:4)

(3) A maior motivação para obedecermos a Deus não deve ser o medo do castigo ou a expectativa da premiação, mas a maior motivação e intenção de obedecer a Cristo é o amor incondicional a Deus de todo nosso coração. (Mt 22:37)

(4) Nossa obediência é possível com o Espírito Santo morando em nós. O homem pecador não salvo não é habitação do Espírito Santo, e por isso, é impossível obedecer a Deus por si só. Mas o salvo pela graça é habitação do Espírito Santo que o capacita a obedecer o que Jesus Cristo o ensinou. Assim, somos transformados dia a dia quando o Espírito Santo de Deus produz o seu fruto em nosso caráter. (Gl 5:22)

(5) Cristo nos apresenta diante de Deus como pessoas inocentes, livres de qualquer acusação, justos, santos e obedientes. Assim, devemos obedecer a Deus durante a vida cristã porque Cristo já declarou que somos obedientes e nos apresentou diante de Deus como filhos obedientes. Ou seja, nos tornamos obedientes porque já somos obedientes. E por isso, nenhuma condenação há para os filhos obedientes de Deus que estão em Jesus Cristo, nosso Senhor. (Cl 1:22)

JAIRO FILHO

Zé e os gerentes


Você já viu uma cena como essa antes? Em que posição você estava quando viu essa cena? Você estava dentro do buraco ou estava na platéia observando? Fazendo o que? Servindo ou analisando/mandando o serviço e o servo? Você era o Zé ou o Gerente? O cristão deve ser o Zé ou o gerente? Jesus foi o Zé ou o gerente? Reflita sobre sua identidade, seu status, suas atividades e sobre sua espiritualidade.

JoZé Jairo do Amaral Filho

QUEM AMA SANGRA


"Ele olhou ao redor da montanha e previu uma cena.

Três corpos pendurados em três cruzes.

Braços estendidos.

Cabeças inclinadas para frente.

Eles gemiam por causa do vento.

Homens fardados estavam sentados no chão, perto dos três.

Homens com roupas de religiosos se afastaram para o lado... arrogantes, convencidos.

Mulheres envolvidas em sofrimento estão reunidas ao pé da montanha... rostos marcados pelas lágrimas.

Todo o céu se levantou para lutar.

Toda a natureza se ergueu para o resgate.

Toda eternidade posicionou-se para dar proteção.

Mas o Criador não deu ordem alguma.

"Isso deve ser feito...", disse, e retirou-se.

O anjo disse outra vez: "Seria menos doloroso se..."

O Criador o interrompeu brandamente: "Mas não seria amor..."

Autor desconhecido

A pérola de grande valor


Jesus disse que “O Reino dos céus também é como um negociante que procura pérolas preciosas. Encontrando uma pérola de grande valor, foi, vendeu tudo o que tinha e a comprou.” (Mt 13:45). Temos que entender de antemão que Cristo é a pérola de grande valor. E quando encontramos Jesus, temos que entregar tudo a ele.

Juan Carlos Ortiz faz uma bela explicação, paráfrase e contextualização dessa parábola da pérola de grande valor. Permitam-me contá-la com minhas palavras. É mais ou menos assim:

Certo homem passava todos os dias em frente a uma joalheria. Seus olhos sempre miravam uma pérola de grande valor que estava exposta na vitrine. Cada dia que passava aumentava o desejo de possuir aquela pérola. Mas esse homem tinha certeza que nunca poderia comprá-la, porque ele pensava que custava muito caro.

Certo dia, esse homem tomou coragem e entrou nessa joalheria e perguntou ao joelheiro:

“Quanto custa essa pérola?”

“Bem”, diz o joalheiro, “ela é muito cara.”

“Mas quanto é?” perguntou o homem.

“É uma soma bem considerável.”

“O senhor acha que eu poderia comprá-la?”

“Ah, naturalmente. Qualquer pessoa pode.”

“Mas o senhor disse que era muito cara?”

“Disse.”

“Quanto é, então?”

“Tudo que você possui”, respondeu o vendedor.

O homem pensou um pouco e disse: “Está bem; eu compro.”

“Então vamos ver o que você possui. Vamos anotar tudo aqui.”

“Bem, tenho dez mil dólares no banco.”

“Dez mil dólares. Ótimo. E o que mais?”

“Só isto. É tudo o que possuo.”

“Nada mais?”

“Bem, tenho alguns trocados no bolso.”

“Quanto?”

“Bem, aqui está, trinta, quarenta, sessenta, oitenta, cem, cento e vinte dólares.”

“Ótimo. O que mais você tem?”

“Nada mais. Isto é tudo.”

“Onde você mora?” Indaga ele querendo sondar.

“Em minha casa. É, eu tenho uma casa.”

“Então, dê a casa também”, e acrescentou a casa na lista.

“Está querendo dizer que tenho que morar em minha tenda de camping?”

“Possui uma tenda também? Ela também entra no negócio. O que mais?”

“Terei que dormir no carro.”

“Ah, possui um carro.”

“É, na verdade tenho dois.”

“Todos os dois passam a ser meus. O que mais?”

“Bem, o senhor já está com meu dinheiro, minha casa, minha tenda, meus carros. O que mais quer?

“Você é só no mundo?”

“Não; tenho esposa e dois filhos...”

“Então a esposa e os filhos são meus também. O que mais?”

“Não resta mais nada. Estou sozinho agora.”

“Ah, quase me esquecia. Você também. Tudo agora é meu – sua esposa, filhos, dinheiro, carros e você também.”

E depois o joalheiro continua: “Agora escute: Deixarei que você fique com estas coisas por enquanto. Mas não se esqueça que elas são minhas assim com você também. E quando eu precisar de qualquer uma delas, você terá que entregá-las, pois eu sou o proprietário.

E é assim que as coisas se passam quando estamos sob o domínio de Jesus Cristo. É assim que temos que encarar tudo o que possuímos na vida e as perdas da vida. Não temos nada. Tudo o que temos está sob o Reino de Deus. E a qualquer momento ele pode pegar de volta o que é dele. Enquanto isso, seja apenas um fiel mordomo.

Jairo Filho

ENTREVISTA DO JORNAL CONECTUDE

ENTREVISTA DO CONECTUDE AO JAIRO FILHO

(1) CONECTUDE: Enquanto cristão sei que posso (ou ao menos deveria poder) fazer algumas coisas pela minha geração. Mas não é tão simples!!! Que formas práticas a minha vida deve tomar para que eu possa fazer a diferença em nosso mundo?

(2) CONECTUDE: Escola, faculdade, família, trabalho, amigos... em nossos maiores espaços de atuação estamos cercados de não cristãos. Qual a forma mais adequada de mostrar a minha fé para essas pessoas e levá-las a uma aproximação de deus?

JAIRO FILHO: Respondo essas duas perguntas nessa resposta. Para ser diferente do mundo - fazendo a diferença em nossa geração - precisamos ter algumas posturas práticas na escola, faculdade, família, trabalho, amigos....enfim, no mundo em que vivemos.

1. DESENVOLVER UMA MENTALIDADE CRISTÃ – Deus nos chama a não se conformar com a forma/padrão desse mundo (Rm 12:2), oferecendo toda a nossa vida em sacrifício santo e agradável a Deus, tendo a mente de Cristo (I Co 2:16), para adorar em espírito e em Verdade (Jo 4:23, 24) e orar e cantar com o espírito, mas também com o entendimento (I Co 14:15), porque, como disse John Stott, “crê é também pensar”.

A mentalidade cristã expressa evangelho da graça – Em tempos em que uma pluralidade de espiritualidades surge em nosso meio, somos chamados a pregar, exclusivamente, a Jesus Cristo, e este, crucificado, no poder do Espírito Santo, a fim de que a fé dos que crêem não seja baseada em sabedoria ou justiça humana, mas no poder de Deus (I Co 2:2-4) . O evangelho da graça, pregado e vivido, exclui qualquer tipo de sincretismo religioso, barganha, penitências, justiça própria, magias, culpa e medo, e os mais diversos maniqueísmos. Mas o evangelho da graça, pregado e vivido, traz libertação, perdão, adoração, discipulado, amor, serviço, comunhão. Enfim, o evangelho sem a cruz de Cristo não é cristianismo. Assim, uma mentalidade cristã vive e prega o evangelho da graça.

A mentalidade cristã expressa leitura do mundo atual – Como cristãos nesse mundo pós-moderno, somos também chamados a discernir o mundo em que vivemos, captando os movimentos filosóficos que são contra a vontade de Deus, desenvolvendo uma mente “Crística” ao consumir a mídia impressa, radiofônica e televisiva, ao consumir moda, alimentos e entretenimentos, ao desfrutar dos mais diversos tipos de relacionamentos virtuais ou pessoais e ao expressar idéias e atitudes nos meios em que vivemos. Assim, uma mentalidade cristã discerne, a partir do evangelho, o mundo em que vivemos.

2. SER MILITANTES CRISTÃOS NUM ENGAJAMENTO SOCIAL – Somos chamados para dar o pão de cada dia e o pão da vida aos perdidos e necessitados. Estou cansado de presenciar a igreja ser consumida pela inércia do ócio egoísta e não sair para cumprir a grande comissão. Não agüento mais ver as planilhas financeiras da igreja trocarem a ajuda ao pobre por projetos egoístas, fúteis e inúteis de construção das paredes de templos em nome do poder da tradição. Estou cansado de ver as igrejas-ilhas isoladas, arrebatadas e alienadas sublimarem sua encarnação no mundo psico-sócio-político cultural da vida real, fugindo para a espiritosfera de seus cultos extáticos e inertes. Sem engajamento social, não serviremos mais para nada, exceto para ser jogado fora e pisado pelos homens (Mt 6:13b). Mas nosso engajamento social é a luz do mundo, para que o mundo veja as nossas boas obras em favor do próximo e glorifiquem a Deus Pai (Mt 6:16). Assim, vivam engajados socialmente através de iniciativas de ação social (ofereçam comida para moradores de rua, cestas básicas para famílias carentes, aula de alfabetização para adultos e alfabetização digital para jovens, cursos profissionalizantes e etc.) e contribuição financeira para ONGs, creches e institutos de ação solidária.

3. CONSAGRAR A CARREIRA PROFISSIONAL À SERVIÇO DO REINO – O trabalho não é castigo por conseqüência do pecado, porque antes da queda o primeiro casal já trabalhava a administração do jardim. O trabalho revela nossa imago dei – ou seja, a imagem e semelhança de Deus em nosso ser – quando expressamos nosso potencial humano. O trabalho é nossa adoração a Deus quando entendemos a teologia bíblica do sacerdócio universal – ou seja, cada crente é chamado a servir a Deus no mundo com a sua profissão. Um pedreiro, um engenheiro, um carpinteiro, um agricultor ou um médico servem a Deus da mesma forma que um sacerdote e um bispo ordenado. Assim, o trabalho passa a ser visto como uma atividade digna do homem, forma de glorificação a Deus e sinal de salvação. Trabalhar também é a nossa missão no mundo. Porque nosso trabalho tem a função de cooperar com Deus para colocar ordem no caos e para a redenção do universo. Ou seja, quando trabalhamos estamos mostrando Deus trabalhando no mundo. Assim, nossa profissão e nosso jeito de trabalhar devem ser boas obras que levem o mundo sem Deus ao arrependimento de suas obras más. Somente assim, os homens verão nossas boas obras e, certamente, glorificarão nosso Pai que está nos céus. E Jesus Cristo, no rosto dos necessitados, nos abençoará e receberá toda nossa vida, adoração e serviço.

(3) CONECTUDE: NOSSO MAIOR ESPELHO É CRISTO. NELE TEMOS O MELHOR MODELO DE COMO QUEREMOS SER... MAS É POSSÍVEL EM PLENO SÉCULO XIX ANDAR REALMENTE COMO ELE ANDOU? OU NUNCA ALCANÇAREI O PADRÃO DE DEUS?

JAIRO FILHO: Cristo não é o nosso melhor modelo. Ele é o único e exclusivo modelo para a vida cristã. Mas, muito além de Cristo ser o nosso modelo, ele é o nosso Senhor. Se Cristo é o nosso Senhor, devemos renunciar todas as nossas posses e bens, e a nossa identidade e status social para viver com Deus. Crê que Cristo é o nosso Senhor é entregar toda a nossa vida nas mãos dele. E não sair por aí reclamando: “Restitui, me dá de volta o que é meu...”. Porque, primeiro, Deus não é um Ladrão que nos rouba, e segundo, as perdas da vida só acontecem porque são permitidas pela mão soberana e amorosa de Deus. Assim, não temos direito a nada. Deus nos dá tudo o que temos e o que somos para administrar, e quando Ele pedir de volta, nosso coração deve se desprender de tudo. Quando reconhecemos que Cristo é o nosso Senhor, nosso coração abandona o pecado para possuir a santidade de Cristo. E a cruz de Cristo nos apresenta santos, inculpáveis e livre de toda acusação (Col 1:22) e, por isso, não há nenhuma condenação para aqueles que estão em Cristo Jesus, nosso Senhor. Isso significa que devemos nos tornar o que já somos. Somos Santos como Jesus, mas ainda não somos completamente. Só seremos completamente santos, na glorificação. E isso, acontecerá só na eternidade (I Co 13:12). Assim, nossa vida de santificação é um processo contínuo até chegar glorificação na eternidade, onde veremos Deus face a face. Assim, mesmo nos século XXI podemos ser como Jesus. Devemos seguir a Jesus. E pisar onde ele não pisou. Jesus nos chama para ir onde Jesus de Nazaré não pisou. Mas ainda não poderemos ser plenamente santos como Jesus. Só o seremos na eternidade, quando recebermos corpos glorificados.

(4) CONECTUDE: COMO PODEMOS VIVER A VIDA CRISTÃ NA PERSPECTIVA DIVINA?

JAIRO FILHO: Viver a vida cristã na perspectiva divina é viver pela graça de Deus mediante a cruz de Cristo guiado pelo Espírito Santo. A graça de Deus toma iniciativa de vir até nós e nos resgatar do reino das trevas para o reino do filho amado de Deus, Jesus Cristo. Viver mediante a Cruz, é entender, crer e viver sem justiça própria, mas sim, pela graça que nos liberta de nossos pecados para vivermos para Deus. E viver guiado pelo Espírito Santo, é viver na plenitude do Espírito para frutificar em nosso caráter o Fruto do Espírito (Gl 5:22) e os dons do Espírito (I Co 12-14) a serviço do próximo para edificação da igreja. E resumo: A vida cristã é essencialmente relacionamento de amor com Deus através de Cristo, guiado pelo Espírito Santo. Isso exclui qualquer tipo de religiosidade.

Termino por aqui e deixo para vocês estas palavras de um cristão que marcou sua geração: "Quero que me digam que eu tentei ser direito e caminhar ao lado do próximo. Quero que vocês possam mencionar o dia em que tentei vestir o mendigo, tentei visitar os que estavam na prisão, tentei amar e servir a humanidade. Sim , se quiserem dizer algo, digam que eu fui um arauto: um arauto da justiça, um arauto da paz, um arauto do direito. Todas as outras coisas triviais não têm importância. Não quero deixar nenhuma fortuna. Eu só quero deixar uma vida de dedicação! E isto é tudo o que eu tenho a dizer: Se eu puder ajudar alguém a seguir adiante, Se eu puder animar alguém com uma canção, Se eu puder mostrar a alguém o caminho certo, Se eu puder cumprir o meu dever cristão, Se eu puder levar a salvação para alguém, Se eu puder divulgar a mensagem que o Senhor deixou... ...então a minha vida terá valido a pena!" Escrito por Martin Luther King Jr.

CONECTUDE, Deus te crie com muito amor.

Jairo Filho – Pastor de jovens e adolescentes da IPB de Imbituva-PR.

A hermenêutica do preservativo

Uma professora de piano e órgão, solteirona convicta, muito admirada por ser a única pianista na cidadezinha, recebe uma chamada telefônica do padre notificando sua visita para felicitá-la por seu 85.º aniversário.

Quando o padre chega na casa da velhinha, se dá conta de que, sobre o órgão, há uma jarra de vidro cheia de água com uma camisinha flutuando dentro.

O padre não consegue acreditar no que vê e tenta disfarçar seu assombro diante da professora. Após alguns momentos de conversa falando sobre a vida da anciã, e de já ter tomado dois cafezinhos, o padre continua atônito olhando aquela camisinha flutuando na jarra de vidro. Não agüentando mais, decide matar sua curiosidade.

- Perdoe-me, filha, mas poderia me explicar o que é aquilo? (apontando a jarra com a camisinha).

- Ah, claro que sim, padre, uma coisa maravilhosa. O ano passado eu estava caminhando pela cidade e, de repente, vi um envelopinho no chão que dizia em letras muito pequenas: "Coloque-o sobre o órgão, mantenha-o úmido e você vai prevenir qualquer enfermidade". E desde então, nem gripe me tem dado..."

O trabalho nosso de cada dia


INTRODUÇÃO

Você continuaria trabalhando se ganhasse 1OO milhões de reais? A grande maioria diria um NÃO em alto e bom som. Porque muitos brasileiros não querem mais sentir aquela pertubação nos fins de noite de domingo, quando termina o "Fantástico" e se deparam com a volta a realidade. Este conflito se faz quando a anestesia do descanso e do entretenimento do fim de semana acaba para encararmos mais uma vez a rotina semanal de trabalho duro. E isso não poderia ser diferente. A palavra trabalho vem do latim "tripallium" que significa literalmente “instrumento de tortura e castigo”. É por isso que muitos brasileiros apostam suas economias nas loterias com a esperança de se tornarem milionários pelo resto de suas vidas e nunca mais precisarem ser torturados pelo trabalho a fim de se sustentarem.

E como seria viver sem trabalhar? Qual o significado e o sentido do trabalho em nossas vidas? A vida sem trabalho se torna num cotidiano de tédio, ócio e desvalorização do potencial humano na vida em sociedade. Mas trabalhar promove dignidade humana, realização pessoal, sentido existencial e progresso social. Trabalhar é o instrumento de Deus para por ordem no caos do mundo sem Deus. É tornar mais facil as relações sociais. É promover a justica, a igualdade, a solidariedade e fraternidade. Se não acreditarmos nisso, nossa única saída será nos enterrarmos num niilismo existencial com cinismo, ceticismo e desdém pela nossa vida e pelo mundo ao nosso redor. Nenhum dinheiro no mundo poderia comprar os eternos valores morais e espirituais que o trabalho pode preencher na alma humana, porque são valores inerentes a natureza humana e a vida social. Ou seja, somos mais humanos quando trabalhamos.

Para entendermos melhor o significado do trabalho, ouse perguntar a três pedreiros o que eles fazem e eles dirão respostas bem diferentes. O primeiro deles poderá dizer que está trabalhando apenas para ganhar dinheiro e sobreviver. O outro dirá que não sabe fazer outra atividade, a não ser assentar tijolos e construir paredes. E ainda, o último poderá dizer que está construindo a cidade que seus filhos vão morar. Seja por dinheiro, vocação ou cidadania, o seu trabalho vai encontrar mais dignidade, motivação e sentido quando você tiver um conceito mais elevado do significado do seu trabalho para sua vida e para as pessoas que te cercam. Por isso, é necessário entendermos mais sobre o sentido e o significado do trabalho em nossas vidas.

A REFORMA DO TRABALHO E O TRABALHO DOS REFORMADORES

Desde muito tempo, a tradição crista do catolicismo romano considerou o trabalho como castigo de Deus e um mal necessário. Evidente que depois da queda do homem, a lógica da criação foi alterada, porque todo o cosmo ficou desfigurado e desequilibrado. Depois da queda, o homem passou a trabalhar duro para tirar da terra seu sustento que antes era dado sem maiores esforços (Gn 3.17-19). Mas, com a reforma protestante do século XVI, os reformadores protestantes entenderam que a Bíblia nos diz que o trabalho foi dado por Deus, mesmo antes da queda. A Bíblia nos diz que o primeiro casal foi responsável pela administração, cuidado e preservação do jardim. E a Adão foi dado o trabalho de dar nomes aos animais (Gn 1.26b, 28 – 30 e 2.15, 19e 20). O jardim era a casa e o ambiente de trabalho do primeiro casal. O trabalho foi dado por Deus ao homem como algo bom, reto e justo (Gn 1.31). Além disso, o trabalho manifestava e desenvolvia o potencial das faculdades do homem, a preservação da vida social e da criação. E toda a herança protestante passou a enxergar o trabalho como um serviço a Deus e como um instrumento de Deus para por ordem no caos do mundo sem Deus. Assim, o trabalho revela (1) nossa identidade, (2) nossa adoração a Deus, e (3) nossa missão no mundo.

1. NOSSA IDENTIDADE

Sabendo que o trabalho é uma dádiva de Deus e que é inerente a vida humana individual e social, podemos dizer que o trabalho é a expressão da imagem de Deus no homem e na sociedade. Fomos criados como uma cópia de Deus (Gn 1.26, 27). Isso quer dizer que fomos criados com algumas características de Deus doadas a essência de nosso ser. Logo, podemos dizer que o trabalho é uma experiência da manifestação do desenvolvimento do potencial humano. Trabalhar é expressar e desenvolver talentos e aptidões. É canalizar o que somos, o que sabemos e o que fazemos servindo as pessoas ao nosso redor. É trabalhando que nossa identidade emocional, social, intelectual e espiritual se constrói convivendo em sociedade. Enquanto isso, nossa biografia vai sendo escrita quando as pessoas testemunham de nosso serviço, identidade e produtividade em prol da comunidade. Em resumo, a imagem de Deus no homem se manifesta no trabalho.

A nossa identidade como imagem de Deus deve ser uma das maiores motivações para acordarmos cedo na segunda-feira e mostrarmos Deus trabalhando no mundo. Quando criamos, organizamos, analisamos, desenvolvemos, produzimos, projetamos e comunicamos estamos manifestando todo o potencial humano que temos da imagem de Deus em nós. Isso implica dizer que quando nosso trabalho manifesta o belo, a lógica do raciocínio científico, o progresso tecnológico, a sensibilidade, a intuição, as relações pessoais, a preservação ecológica, a ética, a transcendência espiritual, a vontade de superar limites, as aptidões e talentos inatos e a força física revelamos Deus trabalhando em nós e conosco no mundo. Assim, todas as nossas características bio-psico-sócio-espiritual é um milagre da imagem de Deus no homem.

Quando reconhecemos que nosso trabalho revela nossa identidade, podemos encarar nosso trabalho como uma forma de realização humana ao expressar o melhor de nós mesmos para o próximo na promoção do bem comum. Assim, o trabalho passa de, simplesmente, um compromisso de bater o cartão de ponto numa organização ou somente a busca por sustento financeiro, ou de uma busca individual de uma carreira profissional de sucesso, e passa a ser nossa identidade existencial e social. E, a partir do conceito da imagem de Deus no trabalho, as atividades profissionais da semana passam a ser executadas com muito mais prazer, responsabilidade e sentido.

2. NOSSA ADORAÇÃO A DEUS

O catolicismo medieval entendia que o serviço a Deus se resumia exclusivamente a uma vida dedicada ao ministério monástico e as ordens sagradas da igreja. O trabalho era visto como atividade física, não digna, algo inferior, secular, profano, atividade dos servos e do povo. Logo, o clero e a nobreza dedicavam-se a outras atividades mais “nobres” e intelectuais que não houvesse nenhum tipo de esforço físico. Por isso, não havia interesse algum no trabalho por parte da igreja e da nobreza. Mas, ao entender que o trabalho foi uma dádiva de Deus e revela nossa identidade, os reformadores protestantes elaboraram a teologia bíblica do sacerdócio universal dos crentes; ou seja, o conceito bíblico de serviço cristão engajado no mundo através do trabalho. Servir a Deus era estar no mundo, vivendo engajado em todas as realidades do cotidiano para a transformação social e para glória de Deus. A igreja passa a ser agência de transformação histórico-social e cada crente passa a ser vocacionado para servir a Deus com sua ocupação, ofício e profissão. Ou seja, um sapateiro, um ferreiro, um lavrador, um mecânico servem a Deus da mesma forma que um sacerdote e um bispo ordenado. Porque agora, todo crente tem acesso a Deus por meio de Cristo, através da leitura da Bíblia e das suas próprias orações. E assim, todo crente, independente de sua profissão, pode servir a Deus engajado no mundo. O trabalho passa a ser visto como uma atividade digna do homem, forma de glorificação a Deus e sinal de salvação.

Quando lembramos da doutrina do sacerdócio universal dos crentes, percebemos o quanto essa doutrina tem sido esquecida pela igreja. É fácil perceber o dilema de crentes que desejam servir a Deus na igreja local, mas dizem que são impedidos pela necessidade do ganha pão através do trabalho secular. Muitos pedem a Deus para sair do emprego afim de se dedicarem mais tempo as atividades da igreja-templo. Esse dilema é resultado da herança do catolicismo medieval que ainda carregamos. Hoje, nossa idéia de serviço cristão se resume às atividades na igreja-templo-denominação durante as liturgias dos cultos dominicais. Até mesmo nossa adoração e serviço a Deus tem sido resumido a cultos em ajuntamentos. Não conseguimos enxergar que nossa adoração e serviço a Deus podem ser realizados nas atividades do nosso cotidiano ambiente de trabalho. E muito menos, conseguimos enxergar nosso ambiente de trabalho como campo missionário.

O trabalho deve ser encarado como uma atitude de adoração a Deus. Deve ser um culto cotidiano no ambiente de trabalho enquanto realizamos nossas atividades profissionais. Nosso trabalho deve ser a oferta que brota de nosso coração de tudo o que somos e o que fazemos para Deus e para o próximo. E na medida que trabalhamos, nós progredimos em nossa jornada do crescimento pessoal quando revelamos a expressão da imagem de Deus em nós. Pois, quanto mais criativos, laboriosos e úteis, mais cresceremos na experiência do caráter de Cristo. Assim, trabalhar se torna um culto espiritual a Deus tanto quanto um culto de adoração no templo.

3. NOSSA MISSÃO NO MUNDO

Nosso serviço a Deus deve ser intramundo. Ou seja, devemos viver engajados nas realidades do mundo que nos cercam e conviver e servir as pessoas fora dos corredores eclesiásticos. Porque nosso trabalho tem a função de cooperar com Deus para colocar ordem no caos e para a redenção do universo. Ou seja, quando trabalhamos estamos mostrando Deus trabalhando no mundo. Nosso trabalho é a manifestação da providência de Deus em preservar a criação, as relações sociais e nossa identidade como seres humanos. O trabalho nosso de cada dia se torna espiritual quando encaramos nosso serviço como nossa missão no mundo, a medida que distribuímos amor, riqueza e recursos de Deus para todos através de todos.

Nosso trabalho deve sinalizar o Reino de Deus que está em nós e entre nós. E por Reino de Deus não podemos entender que significa exclusivamente igreja-templo-clero-domingo-culto. Por Reino de Deus devemos entender que é o domínio soberano de Deus sobre toda sua criação, já inaugurado na vida histórica de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo de Nazaré, com a finalidade de destruir o mal, libertar o homem do pecado e salvá-lo para desfrutar das bençãos do governo de Deus sobre todo o universo. Mas, o Reino de Deus ainda não chegou em toda a sua plenitude. Ainda o mundo jaz do maligno e muitas pessoas estão presas no Reino das trevas. O Reino de Deus terá sua manifestação plena na segunda vinda de Cristo na terra para buscar os que são seus. E porque o Reino de Deus já veio em Cristo, oramos para que “Venha o teu Reino e seja feita a tua vontade assim na terra como no céu”, uma vez que ainda não veio plenamente. Mas, em breve virá. Maranata! Enquanto isso, buscamos o reino de Deus e a sua justiça (Mt 6.33) quando priorizamos nosso trabalho como parte de nossa missão no mundo de sinalizar o Reino de Deus entre nós, através de nossa profissão.

O trabalho no Reino de Deus deve ser uma denúncia profética contra o mal do modo de produção econômica do capitalismo selvagem. Nosso trabalho no Reino de Deus não deve cooperar com o surgimento da nobreza econômica que explora e oprime seu proletariado e promove a injustiça social e a má distribuição de renda em nosso país. É trágico diagnosticar que no cenário evangélico brasileiro temos uma nobreza de irmãos empresários que dominam e subjugam seus dominados-funcionários-irmãos que dominicalmente cultuam no mesmo templo e semanalmente lutam entre si no ambiente de trabalho. Infelizmente, a igreja evangélica perdeu sua denuncia profética e tem embarcado na mentalidade capitalista quando ascende a desigualdade social dentro da comunidade cristã.

Mas a doutrina cristã do trabalho diz que o trabalho glorifica a Deus quando distribui riquezas e recursos de Deus para todos e através de todos. O trabalho no Reino de Deus não tem espaço para exploração de empregados nem desigualdade social. Isso me faz citar o Rev. Robinson Cavalcanti quando diz que “Deus não criou o emprego, mas o trabalho, e nos manda ganhar o nosso sustento com o nosso próprio suor, e não com o suor do próximo, em um modo de produção em que todos, e cada um, seja senhor do seu corpo, do seu tempo, do seu talento e dos seu meios ou instrumentos”. E tudo seja para transformação social e glória de Deus. Utopia? Não. O Reino de Deus é uma utopia possível. Mas, o que não podemos é nos conformar com este século de exploração capitalista (Rm 12.2) e cair na exploração do potencial humano como meio de lucro dos poderosos e destruir a dignidade humana com a desigualdade social.

O trabalho no Reino de Deus é mais do que serviço de caridade. Quando nosso trabalho é feito em nome de Jesus, sinalizamos o Reino de Deus como instrumento de arrependimento dos pecados. Arrependimento é mudança de consciência, cosmovisão e atitude. Por isso, nosso trabalho deve levar as pessoas ao arrependimento quando revela os valores eternos do Reino de Deus e os confronta como nossas atitudes profissionais pecaminosas. Ou seja, os engenheiros civis cristãos poderiam construir cidades dignas de se viver enquanto denunciam a desigualdade social e criam meio de acabar com as favelas. Os advogados cristãos condenariam o jeitinho brasileiro de burlar as leis de nosso pais criando leis com valores de justiça do Reino de Deus. Os jornalistas cristãos dariam suas notícias como uma voz profética do Reino de Deus em vez da exploração da banalização e da glamourização da maldade humana. Os empresários cristãos fariam um pacto de ética para valorizar mais o ser humano do que o modo de produção capitalista selvagem quando geram empregos com salários e condições de trabalho dignos. Os metalúrgicos cristãos fabricariam sem contaminar o meio ambiente. Os políticos cristãos administrariam as cidades com laicado religioso, mas com os valores do Reino de Deus, como honestidade, justiça e serviço. E o que sugerir a professores, médicos, pedreiros, esportistas, bancários, mecânicos e etc? Todo trabalho realizado como um serviço a Cristo há que beneficiar o próximo e funcionar como um sinal do Reino de Deus. Assim, Jesus poderá nos dizer: "Tive sede e você me deu de beber; fome e você me deu de comer; estive preso e você me visitou; sem moradia e você me deu terra para plantar; sem horizontes e você me deu crédito; explorado e você foi meu advogado; era analfabeto e você me alfabetizou; fiquei doente e você me operou; estava na fila e você me atendeu com dignidade; senti dor e você me sedou; desempregado e você me deu oportunidade de trabalho; triste e você me fez rir; chorando sozinho e você chorou comigo, alegre e você cantou pra mim, sonhando e você me trouxe o esporte...” Assim, nossa profissão e nosso jeito de trabalhar devem ser boas obras que levem o mundo sem Deus ao arrependimento de suas obras más. Somente assim, os homens verão nossas boas obras e, certamente, glorificarão nosso Pai que está nos céus. E Jesus Cristo, no rosto dos necessitados, nos abençoará e receberá toda nossa vida, adoração e serviço.

CONCLUSÃO

Trabalhar é mais do que a busca por dinheiro. É ser mais humano a medida que expressamos a imagem de Deus através de nosso potencial. Trabalhar é uma liturgia cotidiana de adoração a Deus que brota de nosso coração quando revelamos em nós, Deus trabalhando através de nosso serviço às pessoas enquanto crescemos a imagem de Cristo. Trabalhar é nossa missão no mundo de cooperar com Deus na sua missão de redimir o mundo sem Deus. Assim, nesta próxima segunda feira, quando você acordar e for trabalhar, olhe no espelho e veja um trabalhador de Deus mostrando ao mundo toda a sua glória através da tua profissão. E se um dia, você ganhar muito dinheiro, saia do emprego, mas não pare de trabalhar. Que a nossa vida seja viver para Deus em prol das pessoas enquanto trabalhamos no mundo sem Deus. Amém?

Jairo Filho